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6 novembro, 20

Artigos de Especialistas

Oração, Missa e missão cristã

O que é que a nossa oração tem a ver com a oração de Jesus? Isto significa que a sua oração é um modelo para a nossa, ou que ele nos ensina a rezar? Sim, mas não apenas isso. Tudo na nossa oração (que pode ser feita simplesmente como um diálogo com Deus) tem a ver com a oração de Jesus. O Papa Francisco explicou isto na sua audiência geral no dia 28 de Outubro.

Foi especialmente fixada na oração de Jesus no dia da sua baptismo no rio Jordão. Lá iria ele, aquele que não tinha pecado de que se lavar, em obediência à vontade do Pai. E ele não ficou do outro lado do rio na margem, como se dissesse: Eu sou o santo, e vós sois os pecadores. Ele ficou à frente dos penitentes, "num acto de solidariedade com a nossa condição humana".

Este é sempre o caso, o Papa observa: "Nunca rezamos sozinhos, rezamos sempre com Jesus.". Um tema desenvolvido e aprofundado anteriormente pelo Papa Emérito Benedito. Também para compreender Cristo.

A oração do Filho de Deus

Isto é o que diz o Catecismo da Igreja Católica e o que Francisco disse: "O oração O amor filial, que o Pai esperava dos seus filhos, será finalmente vivido pelo próprio Filho único na sua humanidade, com os homens e em seu nome" (n. 2599).

O Evangelho de Lucas diz-nos que quando Jesus estava a ser baptizado, enquanto orava, abriu-se um buraco como se estivesse no céu, e a voz do Pai foi ouvida: "...".Tu és meu Filho; hoje eu te gerei."(Lc 3,22). E o Papa observa que esta simples frase contém um imenso tesouro, porque nos dá um vislumbre do mistério de Jesus e do seu coração sempre voltado para o Pai:

"No redemoinho da vida e no mundo que virá a condená-lo, mesmo no experiências mais difíceis e tristeza que terá de suportar, mesmo quando sentir que não tem onde reclinar a cabeça (cf. Mt 8,20), mesmo quando o ódio e a perseguição se espalham à sua volta, Jesus nunca está sem o abrigo de um lar: ele habita eternamente no Pai."

Francisco acrescenta que a oração pessoal de Jesus "no Pentecostes tornar-se-á por graça a oração de todos os baptizados em Cristo". E por isso aconselha-nos que se alguma vez nos sentirmos incapazes de rezar, indignos de que Deus nos ouça, devemos pedir a Jesus para rezar por nós, para mostrar novamente as suas feridas a Deus Pai, em nosso nome..

Se tivermos essa confiança, o Papa garante-nos, ouviremos de alguma forma essas palavras que nos são dirigidas: "...se tivermos essa confiança, o Papa garante-nos, ouviremos de alguma forma essas palavras que nos são dirigidas: ".Você é o amado de Deus, você é o filho, você é a alegria do Pai do céu.".

Em resumo, "Jesus deu-nos a sua própria oraçãoque é o seu diálogo de amor com o Pai. Ele deu-nos como uma semente da Trindade, que quer criar raízes nos nossos corações. Aceitemo-la! Abraçamos este dom, o dom da oração.. Sempre com Ele. E não estaremos enganados".

Lá se vão as palavras de Francisco na sua catequese de quarta-feira. A partir daqui podemos ir mais fundo na forma como a nossa oração se relaciona com a oração do Senhor, e como isso se relaciona com a Missa, que tem sempre algo de "festa". E como isto nos leva, em última análise, a participar na missão da Igreja. Façamos uma abordagem passo a passo, guiados pelo teólogo Joseph Ratzinger.

Oração, Missa e missão cristã

"Dirijamos a nossa gratidão sobretudo a Deus em quem vivemos, nos movemos e existimos" Bento XVI

A nossa oração como filhos no Filho

O conteúdo da oração de Jesus - oração de louvor e acção de graças, de petição e reparação - desdobra-se a partir de uma consciência íntima da sua filiação divina e da sua missão redentora.

É por isso que Ratzinger observou - na perspectiva do ponto do Catecismo citado por Francisco - que o conteúdo da oração de Jesus está centrado na palavra AbbaA palavra pela qual as crianças hebraicas chamavam os seus pais (equivalente ao nosso "papá"). É o sinal mais claro da identidade de Jesus no Novo Testamento, assim como a expressão sintética mais clara de toda a sua essência. Basicamente, esta palavra expressa o assentimento essencial ao seu ser o Filho. É por isso que o Pai nosso é uma extensão do Abba transferida para nós dos seus fiéis (cf. La fiesta de la fe fe, Bilbao 1999, pp. 34-35).

É assim que as coisas são. A oração cristã, a nossa oração, tem como fundamento vivo e centro a oração de Jesus. Está enraizado nele, vive dele e prolonga-o sem o ultrapassar, uma vez que a oração de Jesus, que é a nossa "cabeça", precede a nossa oração, sustenta-a e dá-lhe a eficácia da Sua própria oração.  A nossa é uma oração de filhos "no Filho". A nossa oração, como a de Jesus e em união com a sua, é sempre uma oração pessoal e solidária.

Isto é possível graças à acção do Espírito Santoque nos une a todos no Senhor, no seu corpo (místico) que é a Igreja: "Em comunhão no Espírito Santo, a oração cristã é a oração na Igreja". "Em oração, o Espírito Santo nos une à Pessoa do Filho único, na sua humanidade glorificada. Através dela e nela, a nossa oração filial comuna na Igreja com a Mãe de Jesus (cf. Actos 1,14)" (Catecismo da Igreja Católica, nn. 2672 e 2673).

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Na Missa Deus está presente

Pois bem, Ratzinger continua, da união com a oração de Jesus, ou seja, da consciência da nossa participação na filiação divina em comunidade com Cristo,a massa prolonga esta oração de Jesus na vida quotidiana. E então, diz ele, o mundo pode tornar-se uma festa.

O que é uma festa? 

Uma festa, diria Bento XVI anos mais tarde, é "um acontecimento em que todos estão, por assim dizer, fora de si próprios, para além de si próprios, e portanto consigo próprios e com os outros" (Discurso à Cúria Romana, 22 de Dezembro de 2008).

Mas - podemos agora perguntar-nos - que sentido faria transformar o mundo num "partido" em circunstâncias como a actual, em no meio de uma pandemiaA crise de uma crise económica complicada, de injustiça e violência, mesmo em nome de Deus, que deixa vestígios de dor e morte por toda a parte?

Mais perguntas: O que é que nós, como cristãos, queremos dizer quando dizemos que nós "celebramos" a missaE porque é que a missa tem a ver com um banquete? E encontramos esta resposta: não, certamente, no sentido superficial da palavra "festa", que está normalmente associada à azáfama um pouco inconsciente e à diversão daqueles que se distanciam dos problemas; mas por uma razão bem diferente: porque na Missa, escreve Ratzinger, colocamo-nos à volta de Deus, que se faz presente no nosso meio.

Isto dá-nos uma alegria serenacompatível com o claro-escuro da fé, com a dor, e mesmo com o morteporque sabemos que mesmo a morte não tem a última palavra. Essa última palavra é apenas amor, que nunca morre.

Foi assim que o Papa Bento XVI explicou, neste longo parágrafo que merece ser transcrito, o que acontece na liturgia cristã:

"Ele [Deus] está presente. Ele entra no nosso meio. O céu foi rasgado e isto torna a terra brilhante. Isto é o que torna a vida alegre e aberta, e une um e todos numa alegria que não pode ser comparada ao êxtase de um festival de rock. Friedrich Nietzsche disse uma vez: "O céu está rasgado".A arte não está em organizar uma festa, mas em encontrar pessoas capazes de se regozijarem com ela.'. Segundo a Escritura, a alegria é fruto do Espírito Santo (cf. Gal 5, 22) (...) A alegria é parte integrante da festa. A festa pode ser organizada; a alegria não pode. Só pode ser oferecido como um presente; (...) O Espírito Santo dá-nos alegria. E ele é alegria. A alegria é o presente em que todos os outros presentes são resumidos. É a manifestação da felicidade, de estar em harmonia consigo mesmo, que só pode vir de estar em harmonia com Deus e com a sua criação. A alegria, pela sua própria natureza, deve irradiar, deve ser comunicada.

O espírito missionário da Igreja nada mais é do que o impulso para comunicar a alegria que nos foi dada."(Endereço à Cúria Romana, 22 de Dezembro de 2008)

A Missa, o evento central da vida cristã

No que diz respeito ao EucaristiaDeve-se lembrar que a refeição da Páscoa judaica já tinha um forte carácter familiar, sagrado e festivo. Combinou dois aspectos importantes. Um aspecto sacrificial, como o cordeiro oferecido a Deus e sacrificado no altar foi comido. E um aspecto de comunhão, comunhão com Deus e com os outros, manifestado na partilha e bebida do pão e do vinho, depois de terem sido abençoados, como sinal de alegria e paz, de acção de graças e renovação do pacto (cf. A Festa da Fé, pp. 72-74).

A Missa assume a essência de tudo isto e ultrapassa-a como um actualização" sacramental (isto é, através de sinais que manifestam uma verdadeira acção divina, na qual colaboramos). da morte e ressurreição do Senhor para a nossa salvação.

Nele rezamos por todos, os vivos, os saudáveis e os doentes, e também pelos mortos. E nós oferecemos o nosso trabalho, tristezas e alegrias para o bem de todos.

A nossa fé assegura-nos que Deus governa a história e nós estamos nas Suas mãos, sem nos pouparmos ao esforço de a melhorar, de encontrar soluções para problemas e doenças, de fazer do mundo um lugar melhor. E assim a massa é a expressão central do sentido cristão da vida.

A nossa fé também nos dá um o significado da morte como um passo definitivo para a vida eterna com Deus e com os santos. Lamentamos naturalmente aqueles que perdemos de vista na terra. Mas não os lamentamos em desespero, como se essa perda fosse irreparável ou definitiva, porque sabemos que não é. Temos fé que, se eles tiverem sido fiéis, estão melhor do que nós. E esperamos um dia estar reunidos com eles para celebrar, agora sem limites, o nosso reencontro.

Da oração e missa à missão

Vamos retomar a linha de Ratzinger. A oração é um acto de afirmação do ser, em união com o "Sim" de Cristo à sua própria existência, à do mundo, à nossa própria existência. É um acto que nos permite e nos purifica para participar na missão de Cristo.

Nesta identificação com o Senhor - com o seu ser e a sua missão - que é a oração, o cristão encontra a sua identidade, embutida no seu ser. Igrejafamília de Deus. E, para ilustrar esta profunda realidade de oração, Ratzinger observa:

"Partindo desta ideia, a teologia da Idade Média estabeleceu como objectivo da oração, e do tumulto do ser que nela ocorre, que o homem deve ser transformado em 'anima ecclesiastica', em 'anima ecclesiastica', em 'anima ecclesiastica'. encarnação pessoal da Igreja. É identidade e purificação ao mesmo tempo, dando e recebendo nas profundezas da Igreja. Neste movimento, a língua materna torna-se nossa, aprendemos a falar nela e através dela, para que as suas palavras se tornem as nossas palavras: a doação da palavra daquele diálogo milenar de amor com aquele que quis tornar-se uma só carne com ela, torna-se o dom da fala, através do qual eu me dou verdadeiramente a mim mesmo e desta forma sou devolvido por Deus a todos os outros, dado e gratuito" (Ibid., 38-39).

Portanto, Ratzinger conclui, se nos perguntarmos como aprendemos a rezar, devemos responder: aprendemos a rezar rezando "com" os outros e com a mãe.

É sempre assim, de facto, e nós podemos concluir pela nossa parte. A oração do cristão, uma oração sempre unida a Cristo (mesmo que não nos apercebamos disso) é uma oração no "corpo" da Igrejamesmo que se esteja fisicamente só e se reze individualmente. A sua oração é sempre eclesial, embora por vezes isto se manifeste e se realize de forma pública, oficial e até solene.

A oração cristã, sempre pessoal, tem várias formas: da participação externa na oração da Igreja durante o celebração dos sacramentos (especialmente a massa)mesmo a oração litúrgica das horas. E, de uma forma mais básica e acessível a todos, a oração "privada" do cristão - mental ou vocal - perante um tabernáculo, perante um crucifixo ou simplesmente descascada no meio das actividades normais, na rua ou no autocarro, no trabalho ou na vida familiar, social e cultural.

Também piedade popular de procissões e peregrinações pode e deve ser uma forma e expressão de oração.

Através da oração chegamos à contemplação e ao louvor de Deus e da Sua obra, que desejamos permanecer connosco, para que a nossa seja frutuosa.

Para que a Eucaristia se torne parte da nossa vida, a oração é necessária.

A oração - que tem sempre uma componente de adoração - precede, acompanha e segue a Missa. A oração cristã é um sinal e um instrumento de como a missa "entra" na vida e transforma a vida numa celebração, num banquete. 

A partir daí podemos finalmente compreender como a nossa oração, sempre unida à oração de Cristo, não é apenas uma oração "na" Igreja, mas também nos prepara e fortalece para participar na missão da Igreja.

A vida cristã, convertida numa "vida de oração" e transformada pela Missa, é traduzida em serviço às necessidades materiais e espirituais dos outros. E enquanto vivemos e crescemos como filhos de Deus na Igreja, participamos na sua edificação e missão, graças à oração e à Eucaristia. Nenhuma destas são meras teorias ou imaginações como alguns poderiam pensar, mas realidades tornadas possíveis pela acção do Espírito Santo.

Como diz o Catecismo da Igreja Católica: o Espírito Santo "prepara a Igreja para o encontro com o seu Senhor; recorda e manifesta Cristo à fé da assembleia; torna presente e actualiza o mistério de Cristo pelo seu poder transformador; finalmente, torna presente e actualiza o mistério de Cristo pelo seu poder transformador, o Espírito de comunhão une a Igreja à vida e à missão de Cristo".

Sr. Ramiro Pellitero Iglesias
Professor de Teologia Pastoral
Faculdade de Teologia
Universidade de Navarra

Publicado em "Igreja e nova evangelização".

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